Artigo

O dia em que São Paulo amou os mendigos

Publicação original: 2007por Joel Rufino dos Santos

Em 1931, São Paulo estava sob intervenção federal. Por diversas razões, boas e más, os paulistas reclamavam muito.

Em 26 de novembro o Diário Oficial do Estado publicou um "aviso" do interventor, Coronel Manoel Rabelo. Era uma ordem ao "Cidadão Secretário da Justiça e Segurança Pública". É fantástico. Leia:

Considerando que se não deve desconhecer o alcance social e moral da mendicidade, que é dignamente exercida; [...] considerando que, quem pede, em público, geralmente demonstra superioridade de sentimentos, por ter de comprimir o orgulho e a vaidade; [...] considerando que recusa ao trabalho não é um vício peculiar às classes pobres; considerando que a contemplação da sociedade demonstra que o maior número de vadios é formado pela burguesia; [...] considerando que existem exploradores em todas as classes sociais; considerando que se há falsos mendigos o número destes é sepre diminuto e que nem assim deixam de produzir em outrem reações altruístas; considerando que não basta a robustez de que alguns mendigos parecem dotados para assegurar-se que o seu aparelho cerebral seja são; considerando assim que o pretender-se julgar pela aparência se o indivíduo necessita ou não de mendigar pode induzir a grave erro; considerando que muitas vezes o mendigo concorre com a sua presença para a manutenção da ordem, evitando muitos crimes; considerando que ocultar os mendigos aos olhos dos forasteiros é querer iludir a estes  quanto à anarquia social em que todos os cididentais vivemos; considerando que o mendigo desperta a atenção, mesmo dos corações mais duros, para os problemas em prol da felicidade humana; [...] considerando que é um dever fundamental o respeito à muljer em qualquer situação que se encontre; considerando que, embora em princípio a esmola deve ser dada, ninguém é a isso obrigado; considerando que dignidade da mendicância escapa - como a de qualquer outra função proletária - à competência judiciária dos órgãos do governo e está unicamente sujeita ao juízo da opinião pública; considerando, portanto, que vedar o livre exercício público da mendicidade é um monstruoso crime de lesa-humanidade;

Concluía o aviso:

determino que ninguém, sob o simples pretexto de exercer a mendicidade, sofra qualquer constrangimento em sua liberdade; que, quando por motivo insofismável de ordem, algum mendigo deve ser afastado do ponto onde se ache, a autoridade competente o faça com todo o cavalheirismo, ainda mais em se tratando de uma senhora, e, finalmente, que só se procura dar asilo aos mendigos que livremente a solicitarem. Peço, pois, que vos digneis tomar as providências que são necessárias para o fiel cumprimento da preste comunicação. 

Saúde e Fraternidade.

Coronel Manoel Rabelo. Interventor Federal.

Mostrei esse documento ao volante da minha pelada.

E ele:

- Pior que é. 

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